Comemoração dos 100 anos da Revolução Bolchevique

Em outubro os comunistas comemoram 100 anos do triunfo da revolução bolchevique que levou ao poder o Partido comunista na então União Soviética. 
Apresentamos uma seleção de cinco poemas, todos escritos em 1917 (o ano da revolução), por poetas russos comprometidos no processo revolucionário.
Os poemas valorizam o poder da palavra, de estética simples, e muito avançada para a época, os poemas apresentam formas e conteúdo que foram aplicados mais de 40 anos depois no teatro e na literatura em países como Inglaterra e Irlanda que são consagrados por terem inaugurado uma nova vertente da dramaturgia, tida como contemporânea e minimalista. 
Poetas selecionados foram Andréi Biéli, Boris Pasternak, Vladimir Maiakovski e Sierguéi Iessiênin. Os poemas foram extraídos do livro Poesia Russa Moderna, traduzidos no Brasil por Augusto e Haroldo de Campos e Boris Schnaiderman.
A Palavra           
(Andréi Biéli)

Na febre de som
do sopro
a treva é flama-fala.

Lá fugindo da laringe, 
a terra exala. 

Expiram
As almas
Das palavras não compostas.

Deposita-se a crosta
Dos mundos que nos portam.

Sobre o mundo formado
Paira a profundidade
Das palavras proferíveis.

Profundamente ora
A palavra das palavras, Sarça viva.

E do futuro
Paraíso
Alça-se a terra adunca
Por onde em chamas, consumindo,
Não passarei: nunca.

Tradução de Augusto de Campos e Boris Schnaiderman

O Dom da Poesia 
(Boris Pasternak)

Deixa a palavra escorregar,
Como um jardim o âmbar e a cidra,
Magnânimo e distraído,
Devagar, devagar, devagar.

Tradução de Augusto de Campos




Definição de Poesia
(Boris Pasternak)

Um risco maduro de assobio.
O trincar do gelo comprimido.
A noite, a folha sob o granizo.
Rouxinóis num dueto-desafio.

Um doce ervilhal abandonado
A dor do universo numa fava.
Fígaro: das estantes e flautas
Geada no canteiro, tombado.

Tudo o que para a noite revela
Nas funduras da casa de banho,
Trazer para o jardim uma estrela
Nas palmas húmidas, tiritando.

Mormaço: como pranchas na água, 
Mais raso. Céu de bétulas, turvo.
Se dirá que as estrelas gargalham, 
E no entanto o universo está surdo. 

Tradução de Aroldo de Campos

Nacos de Nuvem
(Vladimir Maiakóvski) 

No céu flutuavam trapos
de nuvem – quatro farrapos:
do primeiro ao terceiro – gente; 
o quarto – um camelo errante.

A ele, levado pelo instinto, 
no caminho junta-se um quinto.
Do seio azul do céu, pé-ante-pé, 
se desgarra um elefante.

Um sexto salta – parece.
Susto: o grupo desaparece.
E em seu rasto agora se afasta
o sol – amarela girafa.

Tradução de Augusto de Campos

De Transfiguração 
(Sierguéi Iessiênin)

Ei, russos!
Pescadores do universo,
Na rede da aurora colhendo o céu - 
Troai as trompas!

Sob a charrua do raio
Ruge a terra.
Rompe os penhascos a auridente
Relha.

Novo semeador
Erra pelos campos
Novas sementes
Arroja aos sulcos.

Um hóspede-luz
Vem num coche.
Corre entre as nuvens
Uma égua

Sela da égua - 
Azul.
Sinos da sela - 
Estrelas. 

Tradução de Augusto de Campos